
segunda-feira, 28 de dezembro de 2009
Pendular

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

sexta-feira, 13 de novembro de 2009
Reencontro

Me despe teu olho
Graúdo de lua,
Que é tão pleno
Quanto o teu corpo
Leite sereno,
onde repouso.
Tuas mãos passeiam
À procura das minhas
E me encontram,
E me encantam e
Fazem pequenina
Como nunca antes fui.
Me molha teu sonho,
Fluido sorriso
De lágrima e desespero,
Teu toque ligeiro
Sobre o meu corpo,
estremecido.
Me arde o amor
Em outros tons,
Me invade o silêncio
De mil e um sons,
Me encanta o deleite
Do reencontro
Com teu amor.
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
Encontro
"
— E você, por que desvia o olhar?
(Porque eu tenho medo de altura. Tenho medo de cair para dentro de você. Há nos seus olhos castanhos certos desenhos que me lembram montanhas, cordilheiras vistas do alto, em miniatura. Então, eu desvio os meus olhos para amarra-los em qualquer pedra no chão e me salvar do amor. Mas, hoje, não encontraram pedra. Encontraram flor. E eu me agarrei às pétalas o mais que pude, sem sequer perceber que estava plantada num desses abismos, dentro dos seus olhos.)
— Ah. Porque eu sou tímida."
Rita Apoena
A uma desconhecida

O calor da noite tentava se dissolver nos pingos grossos da chuva que insistiam em nos molhar. O toldo pequeno amparava as pessoas que queriam dela fugir. Foi quando te vi. Tua cara lavada de moleque travesso contrastava com o sorriso feminino que emoldurava teus olhos. Teus olhos de índia olharam-me meio que de esquina, e eu olhei para você admirada. Uma cintura fina que a indumentária masculina não queria revelar, mas era inútil. A cintura tinha vida própria. A sinuosidade não se deixava escravizar pela roupa. Antes, a escravizava. As curvas davam à calça mesclada de cinza tons de vermelho invisíveis, pois que mostravam ali um cheiro de mulher que se dispersava pela noite e adentrava as portas do teatro. A blusa era azul como o céu, colada ao corpo, desenhando os seios minúsculos, colados ao busto, ampliando o horizonte de um perfil andrógino. Mas quando falou percebi que era uma menina que estava ali. Cabelo curtinho e espetado, bom de passar a mão e de sentir o arrepio dos fios te espetando a mão.
Clarice foi a mãe da conversa. Com um discurso de quem vê o mundo com olhar de uma criança estupefata, me contou sobre a sua descoberta literária: Judith Grosmann. Confesso que a noite, a descoberta, a chuva e a cumplicidade de meu amigo foram bem mais interessantes que a peça. Clarice não se permite desenhar. Antes, fazem esboços sobre o que ela escreve. Mas isso já é alguma coisa. De mim, um sorriso nos lábios em perceber que a vida pode ser boa na simplicidade. E como Clarice mesmo já me dizia: apesar de, se vive.
domingo, 4 de outubro de 2009
Rabisco
Dead Smile
sexta-feira, 4 de setembro de 2009
Ninho

Nesses tempos onde o tempo é areia escorrendo em uma velha ampulheta, nada mais me conforta, me acomoda e me aconchega que a presença refletida de mim mesma em minha casa. Meus cantinhos traduzem o meu silêncio, minhas vontades, minhas manias.Os quadrados da casa, da alma e da vida, se ajustam, se arrumam, se organizam. Tudo silencia o furor de um cansaço que o vento aprisiona em mim. Minha cama explica o tom sutil das florezinhas miúdas de um lençol estampado. Claro, claro que foi presente. As estampas não me caem bem. Lençóis lisos traduzem a certeza do que se sabe, ampliam o tamanho da cama, deixam o meu sono mais tranqüilo. Sou eu toda de uniformidades, de alinhos, de linhas retas e milimetricamente medidas e arrumadas. Minha casa diz e repete pra mim quem eu sou e eu me sinto forte, segura. Uma xícara de café fresco, um chinelo velho e tempo gasto com bobagens ao computador. Acordar cedo e brincar com o lençol, sendo surpreendida pela luminosidade que entra pelas frestas da janela. A moça da pamonha com sua toada insistente e as notícias do jornal que se repetem, mas não perdem o cheiro de novidade. Levantar e dar de cara com as estantes, imóveis, mas sorrindo com os dentes abertos, cheinho de livros. Tocar em cada um deles. Ouvir uma música de Hendel enquanto saboreio um café e um pão quentinho, recheado com sabor de leve brisa. E nesses momentos simples e tão únicos é que se percebe e se sente o que é realmente estar em paz.
quarta-feira, 1 de julho de 2009
Eu sou poeta e não aprendi a amar
Sou fera, sou bicho, sou anjo e sou mulher
Minha mãe e minha filha,Minha irmã, minha menina
Mas sou minha, só minha e não de quem quiser
Sou Deus, tua Deusa, meu amor....
Carta ao senhor A.
Você fala de mim com uma precisão tão absoluta que eu, esperançosa que sou, às vezes chego a acreditar que você me entende. Bobeira minha. Ninguém me entende, nem eu mesma. Mas às vezes você me desentende e isso todo mundo sempre faz. Você me põe para pensar. Eu consigo escutar as suas palavras trazidas pelo vento em minha direção. Consigo me comover com suas dores e com suas lembranças, consigo uma ínfima aproximação e, nesses curtos momentos, percebo que sou ligeiramente feliz.
Eu sou alguém que se perdeu de si mesma, confusa entre personagens que eu mesma inventei. Eles me ferem tortuosamente, mas eu me submeto. Ser o que não sou é tão fácil. Ser o que não sou não dói. Não quero me expor, não posso me expor, tenho medo de me expor. Seguro firmemente as grades de me separam deste mundo, o seu. Não é que você não mereça. Não é que você não possa. Eu é que jamais conseguiria chegar até ai.
Tua presença me alivia. Bom ouvir a tua voz como quem acabou de lembrar que tem que tomar um remédio. E dorme tranqüilo, não haverá dores nas próximas oito horas. Pelo menos. O que nos une é diferente de qualquer entendimento das pessoas. Não é namoro, não é sexo, não paixão, não é amor, nada nominável. Estranha mania que o mundo tem de por nome a tudo, de rotular e estabelecer regras para qualquer tipo de relação entre duas pessoas. Não nos encaixamos. Até que tentamos, mas não dá. É um afeto, um encontro, uma coisa boa que persiste. Uma coisa que eu quero que persista. Sem maiores pretensões.
sábado, 27 de junho de 2009
Poeira

Ela não é forte coisa nenhuma... É apenas uma menina grande brincando de casinha. Medo de não fazer certo, medo de as coisas darem errado, medo de não chegar no horário. Grandes medos para uma grande menina. Arruma as coisinhas miúdas no guarda-roupa enquanto ensaia uma arrumação na vida. Lembra de marcar os médicos, lembra de ir à costureira e tenta lembrar de não esquecer nada. Forra a cama com o primor de quem não dorme ali. Sacode a poeira perdida e incrustada na alma e na vida. A casa é enorme, o mundo também.
terça-feira, 16 de junho de 2009
Shelly

terça-feira, 28 de abril de 2009
Silêncio

Paciência!
De contar o tempo
Quando me vês.
Acho envolvente o passeio de suas mãos macias nas minhas
E nos dizemos tantas coisas
domingo, 12 de abril de 2009
Ribeira

Estranheza foi a primeira coisa que eu senti quando cheguei ali. Desde que o ônibus foi chegando ao lugar, vi que as coisas mudavam. As casas eram diferentes, a disposição das coisas nas ruas, as lojas, as pinturas nos muros, as pessoas... Tudo numa lógica diferente, como numa pintura de livro. Parecia que eu estava em outra cidade e não assim tão pertinho de casa.
O mar se anunciava sereno para mim. Sem ondas, sem aquela areia branca a que estou acostumada, sem o cheiro forte de maresia que sempre invade as minhas narinas. Era um mar calmo, um mar parecido com um rio que de quando em quando despejava ondinhas minúsculas que mal balançavam as águas. Havia barcos que mais pareciam braços, espalhavam-se pela água como brinquedos, reiteravam a aura de paz e que davam a impressão que eu estava numa cidadezinha do interior. As pessoas eram diferentes, tudo era silencioso apesar de alguns carros exibirem músicas e de haver crianças correndo. Era um silêncio que se despia em meio ao barulho suave das pessoas e das coisas.
Era uma pintura perfeita. Eu olhava encantada tudo, com cara de quem está perdida e ao mesmo tempo querendo ficar ali e respirar fundo o cheiro de novidade. Se houvesse uma maneira de guardar aquela sensação em um potinho eu o faria. Mas todas as coisas boas que sentimos são levadas sorrateiramente pelo vento. Vão e deixam em nós uma sensação de bem estar que não se pode descrever. Talvez pela necessidade de voltarem e nos encantarem mais uma vez.
quarta-feira, 8 de abril de 2009
Compaixão
terça-feira, 7 de abril de 2009
Despedaços

Para adoçar o dia
Duas colheres de açúcar
Para azedar a noite
Uma gota de água
Para temperar o mundo
Uma colher de café
para perfumar a cama
Duas mãos
Para andar sobre a terra
Duas pernas
Para abraçar a guerra
Uma dor para acalmar a pele
Uma anestesia para sentir a dor
Um branco para colorir a página
Uma solidão para me acompanhar.
Uma vida para morrer em ti.
Um pedaço pra eu ser inteira
Um adeus para te ter mais perto.
Um cobertor para sentir frio
Receita para driblar o vazio,
Mofo para renovar a roupa,
Trabalho para aliviar o cansaço
Espelho para enxergar o outro:
Apenas eu,
Em despedaços.
Realidade

É preciso pagar as contas,
È preciso andar na faixa
É preciso fazer as compras
É preciso subir escadas
É preciso economizar água
É preciso guardar os mortos
É preciso não ter raiva
É preciso reciclar o lixo
É preciso evitar a fofoca
É preciso fazer dieta
É preciso fechar a porta
É preciso amar o outro
É preciso fingir alegria
É preciso cuidar da natureza
É preciso aproveitar o dia
Falsa ilusão de necessidade
De precisões se faz o mundo
É preciso viver e ser feliz...
Mas quando?
segunda-feira, 2 de março de 2009
Sossego

"Me diz o que é o sossego que eu te mostro alguém a fim de te acompanhar..." L.H
quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009
Einsam Abschied

- Filha, você já comeu alguma coisa hoje?
Era melhor não responder. Mas a mãe insistente que era iria continuar a repetição como um velho disco riscado.
- Tô sem fome mãe....
- Menina, assim nada vai dar certo, eu já te disse, você precisa comer, precisa colaborar também, eu estou pagando a terapia, mas você só engordou apenas um quilo até agora...se continuar assim você vai morrer, é isso que você quer?
Levantou-se e deixou a mãe falando sozinha. As coisas que a mãe dizia ecoavam em sua cabeça, queria esquecer, não ouvir, mas não tinha jeito. Sentia um frio que não sabia de onde vinha...sentia na verdade que a mãe tinha razão. Ela não ia morrer, ela já estava morta.
Voltou para casa tarde e alegrou-se por um segundo com a tranqüilidade que habitava cada cômodo. Foi ao banheiro, ligou o chuveiro e ficou de pé, observando a água enquanto a banheira enchia. Tirou cada peça de roupa como num ritual. Enquanto cada peça caía, percorria o seu corpo com um olhar melancólico. Sentia nojo e repugnância ao ver seus ossos, sua pele flácida, seus joelhos, seu ventre. Tudo pendia como uma fruta murcha e apodrecida. Ela era um pedaço perdido de melancolia e podridão. Nua, observava ao espelho seus seios como pedaços de um corpo que jazia incessantemente. Não era mais necessário esperar. Sentia em sua alma a necessidade de ir embora, partir. Sentia que algo de bom lhe aguardava, queria a paz do que não se sabe. Sabia do desconhecido com uma certeza inabalável.
Deitou-se na banheira. A água morna deu ao seu corpo uma sensação agradável de aconchego. Lanhou a própria carne como quem se entrega ao sacrifício. Com a cabeça pendida para baixo, sentia o filete escorrer pelos seus punhos, percorrer todo o seu corpo e encontrar a água da banheira como um rio que encontra o mar e se fortalece com esse encontro de cores. O vermelho inundava tudo. Ela sentia-se invadida por uma paz indescritível, sentia-se cada vez mais leve, leve e leve. Estava indo embora, sem despedidas. Solitariamente.
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009
As outras

Picasso, Les demosielles de Avignon
A interrogação paira sobre minha cabeça
De não saber se sou esta ou se sou a outra
De não saber quem grita dentro de mim em urgência
De não saber quem chora ou quem é feliz
Sussuram em meus ouvidos
As vozes dessas várias mulheres
Paira sobre minha cabeça
A confusão de sentir o que elas sentem
Se são verdadeiras, se mentem,
Estão em mim e eu nelas numa doente simbiose
Procuro um espelho
Onde se reflita a imagem verdadeira,
Seja eu essa mulher inteira,
Seja real em despedaços minúsculos que compõem
O que fui um dia qualquer.
Essas mulheres e nenhuma,
Doce confusão de se sentir absoluta
Delírio inconsistente que perscruta
A face perdida de mim mesmasegunda-feira, 12 de janeiro de 2009
after ventus

O sol é de rachar lá fora, mas o que eu sinto é frio.
Retorno do meu oposto e caio cansada ao chão.
Nada me interessa.
A não ser...
Esse gosto amargo de dor e solidão
Bruma de morte