sábado, 3 de abril de 2010

Water serpents I, Gustave Klimt, 1907.



Chove muito e faz calor. Em casa a luz é rara, breu na sala e na alma. Eu penso em você. Eu lembro, eu sinto, eu choro. Equilibro-me por entre uma razão que ecoa aos quatro ventos e na boca do mundo e entre a falta doída que a tua presença me traz. Respeito, entendo, executo. Ficar longe. Não escrever cartas, não mandar mensagens, não ligar, não...As negativas plausíveis se contradizem. Não pensar em você? Isso não dá para fazer. Seu cheiro ecoa na velha camisola atrás da porta. Enebria meu quarto, meu corpo, meus poros. Meu corpo queima de saudade, minha alma clama por um acontecimento qualquer, uma migalha, um resquício de sentir que me dê esperança. A esperança é uma deusa enganadora, eu sei. Para aplacar o que sinto eu me rendo ao engano, ao erro, ao desvelo...Jogo as razões no lixo. Repito o velho desatino. Antevejo a dor se instaurar e sonho com o alívio da volta. Como um drogadito que pede a última dose, ainda que esta lhe seja fatal. Não sei bem se esta sou eu, nem sei mais quem sou perdida por entre os espelhos tantos. Tonta, vivo das lembranças. Remexo as gavetas, releio as cartas, pairo sobre a tua figura de menina numa foto amarelada tirada na antiga casa. Tua figura de menina que construí mulher, que vi nascer, que alimentei como mãe e reescrevi como filha. E é só de recordações a vida. Na caixa do passado, desbotada pelo tempo dos anos, dos sétimos anos, eu encontro um pouco de alento. E umas palavras perdidas, manchadas de sonho que aqui agora deposito:



Agora tudo o que mais me fascina

É lembrar-me do teu corpo de menina

Inteiro, sereno, perfeito e voraz...

Lembrar-me de tua pele nua, branca

Minha, sua....

Do teu corpo inteiro e de todo o desejo

Que a tua boca me traz

Lembrar-me dos beijos roubados,

Abraços trocados, carícias profundas...

Sentir o gosto do teu sal em minha boca

E toda a paz que meu peito inunda.

Poema escrito em agosto de 2005.

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