terça-feira, 28 de abril de 2009

Silêncio


Acho engraçado você ficar sem graça
Acho confortante o teu sorriso que me diz:
Paciência!


Acho interessante sua memória prodigiosa e seu jeito único
De contar o tempo

Acho comoventes as lembranças que se desenham em seu olhar
Quando me vês.

Acho envolvente o passeio de suas mãos macias nas minhas
Acho interessante o modo ímpar como nos encontramos
E nos dizemos tantas coisas

Em silêncio.

domingo, 12 de abril de 2009

Ribeira


É incrível como a gente sempre tenta enxergar o mundo a partir de um referencial próprio, de um modelo construído. Tudo o que não se enquadra nesse modelo é chamado por nós de estranho. Estranheza é a incapacidade de adequar a nós mesmos aquilo que é diferente. Tudo que é diferente assusta, tudo que é diferente gera interrogações e angustia. Enxergar o diferente sob uma nova perspectiva é sempre um desafio, principalmente quando o estranho é belo e desponta à nossa frente. É um exercício bom de fazer. Se permitir sentir as coisas de forma diferente, enxergar o mundo sob uma nova perspectiva...

Estranheza foi a primeira coisa que eu senti quando cheguei ali. Desde que o ônibus foi chegando ao lugar, vi que as coisas mudavam. As casas eram diferentes, a disposição das coisas nas ruas, as lojas, as pinturas nos muros, as pessoas... Tudo numa lógica diferente, como numa pintura de livro. Parecia que eu estava em outra cidade e não assim tão pertinho de casa.

O mar se anunciava sereno para mim. Sem ondas, sem aquela areia branca a que estou acostumada, sem o cheiro forte de maresia que sempre invade as minhas narinas. Era um mar calmo, um mar parecido com um rio que de quando em quando despejava ondinhas minúsculas que mal balançavam as águas. Havia barcos que mais pareciam braços, espalhavam-se pela água como brinquedos, reiteravam a aura de paz e que davam a impressão que eu estava numa cidadezinha do interior. As pessoas eram diferentes, tudo era silencioso apesar de alguns carros exibirem músicas e de haver crianças correndo. Era um silêncio que se despia em meio ao barulho suave das pessoas e das coisas.

Era uma pintura perfeita. Eu olhava encantada tudo, com cara de quem está perdida e ao mesmo tempo querendo ficar ali e respirar fundo o cheiro de novidade. Se houvesse uma maneira de guardar aquela sensação em um potinho eu o faria. Mas todas as coisas boas que sentimos são levadas sorrateiramente pelo vento. Vão e deixam em nós uma sensação de bem estar que não se pode descrever. Talvez pela necessidade de voltarem e nos encantarem mais uma vez.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Compaixão





Sinto vontade de chorar quando te vejo
Mas não sei o porquê.

Sinto vontade de te trazer pra mim e
Guardar-te numa caixa.

Sinto vontade de te dizer que não sou tão boa quanto você pensa

Vontade de não te machucar nunca mais.

E plantar uma flor com o teu nome

Em meu jardim.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Despedaços




Três gotas de limão
Para adoçar o dia
Duas colheres de açúcar
Para azedar a noite

Uma gota de água
Para temperar o mundo
Uma colher de café
para perfumar a cama

Duas mãos
Para andar sobre a terra
Duas pernas
Para abraçar a guerra

Uma dor para acalmar a pele
Uma anestesia para sentir a dor
Um branco para colorir a página
Uma solidão para me acompanhar.

Uma vida para morrer em ti.
Um pedaço pra eu ser inteira
Um adeus para te ter mais perto.
Um cobertor para sentir frio


Receita para driblar o vazio,
Mofo para renovar a roupa,
Trabalho para aliviar o cansaço
Espelho para enxergar o outro:


Apenas eu,
Em despedaços.

Realidade

El vendedor de alcatraces, Diego Rivera

É preciso acordar cedo
É preciso pagar as contas,
È preciso andar na faixa
É preciso fazer as compras

É preciso subir escadas
É preciso economizar água
É preciso guardar os mortos
É preciso não ter raiva

É preciso reciclar o lixo
É preciso evitar a fofoca
É preciso fazer dieta
É preciso fechar a porta

É preciso amar o outro
É preciso fingir alegria
É preciso cuidar da natureza
É preciso aproveitar o dia

Falsa ilusão de necessidade
De precisões se faz o mundo
É preciso viver e ser feliz...

Mas quando?